O Enxaguante Bucal e Sua Possível Relação com o Câncer de Intestino: O Que Diz a Ciência

Ciência e Tecnologia, Fatos
maio 23, 2025

Introdução

Nos últimos meses, ganhou destaque um estudo científico que sugere uma possível ligação entre o uso regular de enxaguantes bucais à base de álcool e o aumento no risco de desenvolvimento de câncer colorretal. Essa hipótese, que se apoia em dados microbiológicos recentes, tem gerado preocupações na comunidade médica e entre consumidores, especialmente porque os enxaguantes são produtos amplamente utilizados na higiene oral cotidiana.

O Estudo Belga e Suas Conclusões

Publicado no Journal of Medical Microbiology, o estudo foi conduzido por pesquisadores do Instituto de Medicina Tropical de Antuérpia, na Bélgica. O objetivo da pesquisa era analisar os efeitos do uso de enxaguantes bucais com álcool sobre a microbiota oral. O experimento incluiu 59 voluntários que utilizaram o produto por três meses. Em seguida, alternaram para uma versão sem álcool durante o mesmo período, permitindo uma comparação direta entre os dois grupos.

A análise demonstrou que o uso contínuo do enxaguante com álcool reduziu significativamente a presença de bactérias consideradas benéficas, como as Actinobacteria, ao mesmo tempo em que aumentou a presença de microrganismos potencialmente nocivos, como Fusobacterium nucleatum e Streptococcus anginosus. Ambas as bactérias já foram associadas a condições inflamatórias e ao desenvolvimento de cânceres do trato digestivo, incluindo o colorretal e o esofágico.

A Microbiota Oral e a Saúde Intestinal

A relação entre a microbiota oral e a saúde sistêmica vem sendo objeto de estudos há pelo menos uma década. A presença de Fusobacterium nucleatum na cavidade bucal, por exemplo, foi identificada em tecidos tumorais do intestino em diversos estudos anteriores, sugerindo uma possível migração bacteriana e influência direta no microambiente intestinal.

De acordo com a American Association for Cancer Research (AACR), doenças periodontais e perda dentária foram associadas a um risco aumentado de desenvolvimento de pólipos no cólon, que podem evoluir para câncer. Essa conexão destaca a importância da saúde bucal não apenas para prevenir cáries ou gengivite, mas também como fator de proteção sistêmica.

O Outro Lado: A Posição da Indústria

A fabricante do Listerine, um dos enxaguantes citados na pesquisa, contestou os resultados alegando que o estudo possui limitações metodológicas e não fornece evidências conclusivas. A empresa afirma que seu produto é seguro quando usado conforme as instruções e destaca que o Listerine é uma das marcas mais estudadas no mundo.

Ainda assim, a contestação da indústria não anula a preocupação levantada pelos pesquisadores, que reforçam a necessidade de mais estudos para compreender a complexidade das interações entre microbiota, produtos de higiene bucal e câncer.

Repercussões Médicas e Recomendações

Diante das evidências, muitos especialistas têm recomendado cautela no uso diário de enxaguantes bucais com álcool. Em vez disso, sugerem que o consumidor opte por versões sem álcool, especialmente aqueles com histórico familiar de doenças gastrointestinais ou condições inflamatórias crônicas.

Além disso, dentistas e médicos enfatizam a importância da escovação correta, uso do fio dental e visitas regulares ao dentista como estratégias principais para manutenção da saúde bucal, deixando o uso de enxaguantes como medida complementar, e não essencial.

Conclusão

Embora a associação entre enxaguantes bucais com álcool e o câncer colorretal ainda não seja definitiva, os indícios levantados pelo estudo belga acendem um alerta importante. A saúde bucal deve ser encarada de maneira ampla, considerando seu impacto potencial sobre outras áreas do corpo. Mais pesquisas são necessárias, mas o debate iniciado já serve como ponto de reflexão para práticas cotidianas que muitas vezes passam despercebidas.